Véspera de 2014. Os ferroviários
estão envolvidos com festejos de Natal, feriado prolongado, comemoração da
passagem de ano, verão, férias escolares, etc. Como se costuma dizer, o Brasil
só recomeça depois do Carnaval. Bem,
isso é verdadeiro para nós, os mortais, pois forças poderosas movem-se mesmo
durante esse período em que tudo parece estacionado. Parece, apenas, pois o
tempo não para, e nem forças.
Animados com a publicação do
Acórdão - produto dos esforços da categoria em torno da liderança do Sindicato
da Sorocabana (quando sob o cuidado do SINFERP) e da Central do Brasil (sob o
cuidado dos diretores de São Paulo) - fazem da notícia da publicação uma
espécie de presente de final de ano.
Não
é ainda nenhum presente, pois falta a CPTM cumprir o seu teor e convertê-lo em
conquista material para os ferroviários, seja espontaneamente para concluir a
desgastante negociação deste ano, seja por ações que os dois sindicatos diretamente
envolvidos precisam adotar para obriga-la ao cumprimento. Quanto aos sindicatos
de São Paulo e dos Engenheiros nada resta-lhes fazer, senão torcer para que
eventual ação suspensiva da CPTM em Brasília contra o Acórdão tenha sucesso, de
modo a cantar de galo sobre o acordo tapetão que assinaram neste ano, e que foi
empurrado a seco pela garganta dos ferroviários.
Para quem tem memória curta, é
importante lembrar que o SINFERP, por procuração da Sorocabana, e por
deliberação de assembleia, não participou da negociação do presente ano, por
não aceitar: 1) que a CPTM escolhesse quem seriam os interlocutores dos
sindicatos; 2) por ela insistir que a negociação fosse realizada dentro de
dependências da empresa e 3) por determinar – e sem negociação – calendário e
número de rodadas. Sindicatos de São Paulo e dos Engenheiros aceitaram o jogo e
Sindicato da Central, por seus diretores de São Paulo, não assinaram o pratinho
feito que a CPTM apresentou a todos eles, fora da mesa, e que São Paulo e
Engenheiros fizeram de conta ser proposta dos ferroviários. Para aprovar a
proposta da empresa, o Sindicato de São Paulo, e de forma inédita, substituiu
assembleias pelo que chamou de “pesquisa”, à qual os ferroviários respondiam por
escrito nos postos de trabalho, inclusive na presença de chefias.
Foi diante do impasse entre os
que assinaram (São Paulo e Engenheiros) e os que não assinaram (Sorocabana
pelas ações do SINFERP e Central pelas ações de seus diretores de São Paulo)
que as mobilizações tiveram início. Diante delas a dupla São Paulo-Engenheiros apareceu
com novas “conquistas” e, de acordo com eles, pelo simples gesto do envio de um
ofício ao presidente da CPTM. “Conquistas”, naturalmente, que não surgiriam sem
as mobilizações dos sindicatos e dos ferroviários que não se conformaram e não
se renderam à mise-en-scène armada em uma padaria.
Enquanto a dupla São Paulo-Engenheiros
“conquistava”, Sorocabana (por meio do SINFERP) e Central (pelos diretores
paulistas) se esforçavam pela continuidade: Sorocabana para abrir a negociação,
e Central para reabrir, provocando a
CPTM para comparecer em local neutro – DRT-SP. A CPTM não compareceu em
nenhuma das duas convocações. Finalmente greve, TRT, e o Acórdão agora
finalmente publicado. Mas, e dai? O que farão os sindicatos e os ferroviários para
obrigar CPTM a cumprir o seu teor?
Estamos por entrar em nova
negociação sem que a anterior tenha sido encerrada, e isso é preocupante. As
forças não são mais as mesmas. A dupla São Paulo-Engenheiros é a mesma,
verdade, e capaz de inventar assembleia por facebook ou por correspondência.
Afinal, Engenheiros devem fazer parte da mesma mesa em 2014? Pode um sindicato
cujo número de representados cabe em uma Kombi, ser pela CPTM computado como
“um dos quatro”, e dar a ele o mesmo peso decisório dos demais? Bem, o
sindicato de São Paulo aceita o “parceiro” na mesa, evidentemente. Mas, e
sindicatos da Central do Brasil e Sorocabana (o último sob nova direção, sem nenhum
diretor de base da CPTM, e sem a menor ideia do que seja CPTM e seus meandros,
pois a representação sempre foi feita pelo SINFERP)?
Irá a CPTM novamente contratar os
serviços do Dr. Príncipe, pois seus gestores não são capazes de negociar
diretamente com pelo menos um ou outro sindicato, ou diante de um cenário mais
docilizado mudará seus próprios representantes? Sabemos que Eluiz estará à
frente da negociação. Mas, e Central e Sorocabana? A Central estará
representada por seus diretores paulistas ou virão desconhecidos do Rio de
Janeiro? E a Sorocabana? Qual de seus diretores sentar-se-á a mesa para
defender os interesses de uma categoria e de uma empresa que desconhece? Ou
será que, imitando a CPTM, contratará um negociador de fora? Irá terceirizar a
negociação?
Como cada sindicato formará a sua
pauta de reivindicações? Ou será que se apresentarão com uma pauta única? Como
isso será feito, em qualquer das hipóteses? As cláusulas serão debatidas em
assembleias presenciais, ou por e-mails ou facebook? Quem vai ficar do lado de
quem? Ou estarão todos juntos em nome de uma pretensa “unidade”?
As circunstâncias conspiram para
o anúncio da tal “unidade”. Com uma oposição no calcanhar, Eluiz precisa de
“ganhos” que possam amenizar o maior ato venal conhecido na história negocial da
CPTM. Engenheiros também precisam de
“ganhos” que melhorem a imagem, pois, na defesa de seus representados, vendeu a
todos os ferroviários em troca de vantagens para os seus. A Sorocabana, agora sob
nova direção, precisa criar uma imagem própria na CPTM, pois não tem nenhuma
que seja produto de seu próprio esforço.
A todos, portanto, convém a “unidade”,
e com fachada de luta e de combatividade, é claro: discursos inflamados,
boletins regados a palavras de ordem, letras garrafais e cores vibrantes. Some-se
a isso o fato de 2014 ser ano eleitoral em que o governador visa mais um
mandato (sob as luzes do trensalão), o Sr. Bandeira acumular em seu portfolio uma
greve por ano nos últimos três anos, e tudo corrobora para a “unidade”.
Ótimo, poderá dizer o
ferroviário. Unidade, porém, em torno do que, de quem, e dos interesses de
quem? Deles todos (CPTM, PSDB, Sindicatos de São Paulo, Engenheiros e
Sorocabana) sem a sobra da dúvida, e cada qual pelos motivos apontados.
Exceção, talvez, dos diretores paulistas da Central do Brasil.
“Bom” poderá dizer o ferroviário
se o resultado for “positivo” para a categoria. Sim, é verdade, mas a única forma
de assegurar esse resultado positivo é SE a categoria PARTICIPAR de todas as
fases do processo negocial, desde a elaboração da pauta, passando pelo
acompanhamento das rodadas, até a aprovação ou reprovação final do pacote. SE
isso não ocorrer o resultado será péssimo, ainda que “positivo”, pois estará
instituída a cultura do cheque em branco. Conveniente neste ano de 2014,
talvez, mas inconveniente em todos os demais, quando os planetas não estiverem
novamente alinhados. O ferroviário poderá ganhar, mas não necessariamente prosperar.
O SINFERP não participará (exceto
fato novo) por motivos conhecidos de todos, mas não deixará de acompanhar o
andar da carruagem, e de expor suas análises e pontos de vista. Na condição de
ÚNICO sindicato de ferroviários a bater publicamente de frente com a CPTM e
governo do Estado de São Paulo pelas práticas de desmandos e desrespeitos com
usuários e ferroviários, o SINFERP não tem motivo para mudar a sua trajetória,
e muito menos para recuar, pois os desmandos perduram. Isso não é negociável.
Feliz Natal a todos os
ferroviários. Quanto ao desejo de próspero Ano Novo, melhor esperar para ver se
esses votos serão - além de meramente desejados -, transformados em conquista
merecida dos verdadeiros ferroviários.