sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Não esquecemos os mortos e feridos nos trilhos


Helmut Josef Gruber

Entre 27 de novembro de 2011 e 23 de maio de 2012, a CPTM registra em seuportfolio – e apenas contabilizando trabalhadores próprios e terceirizados – o expressivo número de sete mortes nos trilhos. Em cem por cento dos episódios – vale ressaltar - a direção da CPTM apressou-se, antes de qualquer apuração preliminar, em atribuir às vítimas a responsabilidade pela própria morte.

Os protestos do sindicato diante desse quadro desolador estão a ele custando represálias. A CPTM formulou queixa crime contra um sindicalista. Colocou em marcha um plano de perseguição contra alguns de seus dirigentes nos locais de trabalho, move esforços para desalojar a entidade de sua sede social, além de acusar a entidade de ludibriar jornalistas.

Em meio a tantas condutas anti-sindicais, foi um prazer recebermos a visita do Sr. Helmut Josef Gruber. Engenheiro eletrônico com experiência profissional em ferrovias, e advogado, Sr. Helmut é pai de Cauê Gruber, o único sobrevivente do acidente de 27 de novembro de 2011, que ceifou a vida de três experientes ferroviários.

Dos muitos pontos comuns, destaque para o fato do transporte de pessoas sobre trilhos não ter, a exemplo dos modais aéreo e marítimo, uma instância independente, orientada especificamente para a investigação de acidentes ferroviários, em especial os com vítimas. Para cobrir essa lacuna, Sr. Helmut pretende fazer gestão junto a parlamentares, com o intuito de sensibilizá-los para a necessidade da criação desse órgão. Para o sindicato, mais cético e imediatista, parece conveniente que instâncias superiores aos atuais dirigentes da CPTM, a eles determinem a subordinação das políticas de segurança da empresa a uma instituição certificadora externa, sem prejuízo da criação do órgão específico de que fala Sr. Helmut.

Incompreensível para o Sr. Helmut, como para nós, a extinção de uma delegacia especializada em acidentes de trabalho, dois dias depois do acidente de 2 de dezembro de 2011, e que levou a vida de mais dois ferroviários veteranos, passando as investigações, dessa forma, para a Delegacia do Metropolitano, generalista em suas atribuições, e que “não está aparelhada especificamente para essa situação”.

Sr. Helmut J. Gruber pensa em criar, na condição de “medida propositiva”, uma espécie de memorial do acidente, um blog específico, além de medidas correlatas, e recebeu do sindicato o compromisso de todo apoio necessário para a concretização de tais iniciativas.

Sr. Helmut mantém contato com as demais famílias dos acidentados. “Essa tragédia nos uniu”, assegura, e responsabiliza diretamente a cúpula administrativa da CPTM pelo acidente por conta de “erros operacionais”. Como o sindicato, entende que “vários fatores anteriores na estrutura de funcionamento”, criaram as condições para o acidente, e mais especificamente “a falta de comunicação entre os operadores, o CCO, e a ausência de um simples técnico de segurança que poderia ter evitado isso, para liberar ou não a linha, enquanto pessoas ali estivessem trabalhando”. Também como o sindicato, não se conforma com a alegação da CPTM, a época, que os vitimados não deveriam estar transitando pela via, depois de concluído o trabalho em campo, e retornando à base. “Só se eles voassem, afirma, pois não havia nenhum outro acesso que não fosse através dos trilhos. O pátio onde fizeram os testes com o trem ficava encravado entre as linhas do Metrô e da CPTM”.

Sr. Helmut sabe que o acidente no qual seu filho Cauê foi envolvido não é fato isolado. “Sim, sabemos que há uma reiteração de similaridades, um completo descaso, e trata-se de conduta omissiva criminosa. Entendemos que há um crime cometido pela cúpula administrativa da CPTM”. Como o sindicato, Sr. Helmut não teve acesso ao inquérito interno da CPTM. Vai requerer oficialmente, mas, como bem afirmou, “já sei a resposta. Seria como perguntar à raposa quem comeu as galinhas”.

Quanto à afirmação apressada da CPTM, logo após o acidente, que os acidentados foram responsáveis pelo próprio destino, Sr. Helmut entende que tal medida constituiu “um crime contra a honra, pois, no caso do único sobrevivente, trata-se de um profissional formado e bem formado, com especialização no exterior e as afirmações mentirosas da CPTM são injuriosas. Isso também se aplica aos que faleceram, pois se trata de vilipêndio à memória dos mortos, e essa postura infame ensejará a devida medida judicial”.

Cauê Gruber está fisicamente bem, “mas psicologicamente abalado”. Não causou surpresa Sr. Helmut nos dizer que em nenhum momento dirigentes da CPTM apareceram para saber do estado de seu filho.

Oito meses após essa tragédia Cauê Gruber decidiu abandonar a profissão, e encontra na música e nas artes a paz de espírito que lhe foi ceifada.