Os últimos incidentes no Metrô e na CPTM serviram para demonstrar a importância dos serviços dessas empresas na vida de muitos milhares de usuários. Sabia-se disso desde a greve dos ferroviários da CPTM, no ano passado, mas parece que não passou pela cabeça de ninguém que outro motivo pudesse promover efeitos similares.
Desta vez, não tendo a quem responsabilizar, o governo de São Paulo tomou uma decisão, digamos, radical: interromper o tráfego de trens da CPTM na linha 9-Esmeralda, em finais de semana, até ter certeza de que foi tudo visto e revisto, para que novos incidentes – e talvez acidentes – não mais ocorram na linha “nobre” da empresa.
Uma decisão impopular, mas certamente adequada, principalmente se os resultados esperados forem alcançados: nem incidentes e nem acidentes na linha 9-Esmeralda. É um bom começo, e uma mudança na estratégia até então adotada pela empresa, Secretaria dos Transportes Metropolitanos e alguns “especialistas”, com base no reducionismo binário do “pontual” e da “falha humana”. Finalmente alguém percebeu que muitos problemas “pontuais”, em um mesmo lugar, e todos com causação humana, vão além da simples transferência de responsabilidade para “os de baixo”.
A medida do governador, entretanto, deixou muita gente descoberta. Afinal, como ficam todos os gestores da empresa, políticos e “especialistas”, que durante meses bateram nas teclas do “pontual” e da “falha humana”?
O problema não era pontual, mas sistêmico. Trens novos não são capazes de cumprir a promessa dos benefícios deles esperados, em vias (trilhos, dormentes, etc.) imperfeitas, com sistema de sinalização sob a suspeita de falha, com rede aérea que apresenta defeitos, com subestações insuficientes, e com manutenção que não satisfaz nem mesmo o critério de técnicos da empresa.
Se o governador realmente estiver convencido de que é necessário passar tudo a limpo, pode estar diante da oportunidade de arrumar a casa, acertando linha por linha da empresa. Tomara que sim.
De qualquer maneira, quando se fala em problema de sistema, pensa-se de imediato em gestão. Será a CPTM gerida com mentalidade sistêmica? Parece-me que não. Tivesse tal mentalidade, e não enxergaria cada um de seus problemas como um episódio em si. Tivesse tal mentalidade, e não seria refém das inúmeras “falhas humanas” de que tanto reclama.
É apenas uma questão de lógica: em lugar onde “pipocam” tantos problemas “pontuais”, e tanta gente “falha”, está faltando gestão. Gestão, e não chicote.
A CPTM não tem e não alimenta cultura tecnológica (não desenvolve tecnologia). Não tem e não alimenta cultura da segurança (vide o número de acidentes, feridos e mortos). Não tem e não alimenta cultura da qualidade (vide o número de falhas e falta de zelo até mesmo nas estações). Tivesse essa tridimensionalidade cultural, e suas disfunções certamente seriam menores, assim como o tratamento delas, que seria conduzido de outra maneira.
Seria ótimo se o governador aproveitasse a oportunidade, e fizesse uma revisão mais ampla na CPTM.
Rogério Centofanti